sábado, 11 de abril de 2020

CAUCHO - A PRIMEIRA INDÚSTRIA EXTRATIVISTA DE MARABÁ (1)

O CAUCHEIRO - OBRA DO PINTOR MARABAENSE DOMINGO NUNES
Difícil é dissociar o surgimento do primeiro povoado, importante aglomeração de pessoas que deu origem ao município de Marabá, da revolta ocorrida em Boa Vista do Tocantins, depois Boa Vista do Padre João (nestes tempos pertencentes ao Estado do Goiás) e atualmente Tocantinópolis (atualmente Estado do Tocantins). Essa luta armado entre coronéis e igreja católica resultou na saída de Carlos Gomes Leitão em 1894, acompanhado da família e de alguns amigos leais, deixaram suas terras e seguiram rio Tocantins abaixo, dispondo de pequenos botes vindo pararem no Burgo Agrícola do Itacaiúnas.  Aqui começa a colonização de um pedação de terras que denominado de Burgo (ou Burgos), começando uma pequena colônia agrícola, com autorização oficial do então governador do Estado o senhor Paes de Carvalho, assim estava nascendo o pujante município de Marabá.



PRIMEIRA INDÚSTRIA EXTRATIVISTA DO BURGO
Este texto se reveste de importância para a nossa história, todos falam da castanha do Pará, com todo a sua importância, no entanto, a história registra que esta expansão econômica se deu após quase uma dezena de anos, era a borracha o grande produto da região, que criou uma estrutura de exploração aproveitada na época da castanha.

A borracha surgida com a exploração da árvore endêmica “caucho” (castiloa ulei), podiam alcançar de 15 a 20 metros de altura e seu tronco até 50 cm de diâmetro, da família das moráceas , foi a primeira goma elástica que se conheceu na Europa, levadas da América do Sul pelo cientista francês Charles Maria de La Condamine. O caucho se juntou a outras atividades em mesmo período histórico, como por exemplo: dos castanheiros e mariscadores (assim eram conhecidos nestes tempos os caçadores de peles).

Este texto vai dar um destaque especial aos caucheiros, os trabalhadores que nestas terras extraiam o látex para o obtenção da borracha, vale frisar que a borracha pode ser obtida de várias árvores, a mangaba, a seringueira, o caucho, a maçaranduba, a maniçoba, a balata, todos produtoras de látex, produto que se transforma em borracha. O caucho e a massaranduba pelo tempo, a seringa pela defumação e a balata pela fervura.


A DESCOBERTA DO CAUCHO
O caucho foi descoberto na região de Marabá em 1895 pelos irmãos Antônio (ou Antão) e Hermínio Pimentel, que teriam atirado de rifle (há apontamentos que foi o Antônio Pimentel) em uma árvore e dela teria escorrido uma seiva branca. Nesta incursão pela mata, que demorou dias, ao retornarem pelo mesmo caminho perceberam que a seiva estava coagulada, material bastante elástico. Mas, onde foi que descobriram o caucho? No Vale do Itacaiúnas, a extensão de grandes proporções, de Marabá até Conceição do Araguaia, eram os principais focos.

Os caucheiros eram homens rústicos, alimentavam-se de farinha de mandioca, sal e, era comum conduzir no seu trabalho um rifle ou uma espingarda e muita munição, para passar meses enfiados nas matas. Para que adentrassem nas matas os caucheiros eram financiados por “aviadores” que eram proprietários de casas de comércios e forneciam-lhes o necessário para esta ocupação solitária, raramente havia dois ou mais homens em uma colocação, que era uma área extensa a ser explorada. O facão era outra ferramenta muito utilizada, servia para derrubar as árvores, limpeza do tronco, eliminação dos galhos e cipós.


A EXPLORAÇÃO DO CAUCHO
PÉ DE CAUCHO PRÓXIMO DE RIO BRANCO (AC) 1953 AUTOR: GUERRA, ANTONIO TEIXEIRA, 1924-1968; JABLONSKY, TIBOR

Este ciclo durou de 1895 até 1906, quando passou a não mais existir os cauchais. Os trabalhadores cortavam os pés das árvores, incluindo as raízes, com a finalidade de esgotar o leite da parte inferior, para aproveitamento completo como para tirar a madeira. Com cinco ou seis dias o leite já havia escorrido todo. A árvore recebia cortes, anelando a madeira, circundando-a com uma pequena canaleta feita em sua casca até a parte inferior por onde o leite escorria, eram colocadas folhas no chão para evitar o acúmulo de terra e ali o material ficava empoçado. Neste processo fica evidente que a árvore era sacrificada, razão pela qual o cauchais foram se extinguindo, por dia, derrubava-se de 4 a 6 árvores e a época em se trabalhava era o verão pois evitava que o produto se dissolvesse com a água das chuvas.

Com a árvore no chão o caucheiro passava à fase da coleta, com um paneiro segue de árvore em árvore juntando todo o sernambi (látex de caucheira; pode ser também qualquer tipo de resina vegetal. Também é utilizado o termo sarnambi), levando-o para sua barraca, depois jogava em um recipiente com água. Depois dessa fase vem a da lavagem que consiste em bater com um cacete o sernambi sobre uma pedra ou madeira para a soltar toda a terra ou areia.

Depois da lavagem, vem a fase do acondicionamento, que consiste em colocar o produto em uma caixa de madeira do tamanho pretendido. Os que transportavam os seus produtos faziam as suas caixas com capacidade para 60 kg cada uma. Geralmente os animais transportavam 120 kg. Um bom caucheiro podia produzir 2 toneladas por safra, no geral a média era de 1 tonelada, um pouco mais ou pouco menos.

O transporte era realizado por tropas de animais até o curso de um rio, quando não, levava nas costas e desciam pelos rios em balsas utilizando o tronco das árvores amarradas por cipós. A atividade era complexa, as viagens podiam durar até meses até que se encontrasse o curso de um rio, onde pudessem seguir viagens, e o rio Itacaiúnas foi muito utilizado nestas atividades.

Na “Viagem ao Tocantins” obra apócrifa, cita de outra forma essa extração , que consistia na derrubada da árvore, em vista de não se poder poupar a planta que por sua fragilidade, não resiste à sangria periódica adotada para as “héveas[1]”, pois os insetos que se infiltram pelas incisões infeccionam o vegetal que sucumbe em pouco tempo. Cita que os caucheiros do Tocantins trabalham em turmas, aviados pelo patrão de rifle, balas, terçados, farinha, sal, querosene, tabaco e algum medicamento, e não raro dirigidos por eles próprio ou por um seu lugar-tenente, tendo como veículo indispensável das suas peregrinações o pesado batelão afeito ao roçamento nos “secos”, e no qual, em penosas jornadas a remo ou melhor, à vara e forquilha, sobem contra a correnteza do rio, baldeando mantimentos por terra aqui e ali, até o ponto de antemão fixado para centro de exploração.

Com a “rancharia estabelecida”  num limpo perto do rio, à sombra de frondosas árvores, ou levantada a barraca, se o tempo é incerto, fura a mata o “explorador”, homem prático no conhecimento da flora, quando não é uma turma toda já treinada no rude labor que se larga em procura da ambicionada madeira, fácil de reconhecer entre a vegetação circunjacente pelo aspecto amarelado do seu caule liso, um tanto semelhante a sumaumeira, provido de sapupemas ou garras com prolongamentos superficiais das raízes e de longe perceptível pela bela coloração verde mar das suas folhas aveludadas, compridas e grandes, que amarelecem e caem de agosto a setembro, quando então a árvore se mostra apenas a coberta dos frutos miúdos que encerram as sementes.

Ferradas as árvores que descobriu com letras ou sinais golpeados com facão, o caucheiro dá início ao trabalho limpando cuidadosamente em volta da mesma, junto à qual faz na terra duas, três ou mais covas. Procede então diversas sangrias ou entalhes no tronco ou nas garras mais fortes, abrindo sulcos em forma de “V” com os vértices dirigidos às covas, que em pouco tempo se enchem de líquido que escorre. Para este serviço preferem os caucheiros a estação seca, poias as chuvas não poucas vezes estragam a colheita, aguando o leite que precisa de 8 a 10 dias para endurecer. Ao fim do prazo tirados os “couros” de caucho dos seus moldes improvisados e estraído das arvores, o “sernamby” que secou nos sulcos, o caucheiro procede a derrubada da árvore que cai estrondosamente arrastando consigo a mataria em redor.

O rendimento de cada árvore varia consideravelmente nñao sendo raras aquelas que dão 50 kg de goma, o que representa perto de 100 litros de látex. Pela sua maior simplicidade preferem estes homens o processo de coagulação espontânea, embora mais lento, pois o sabão dissolvido, o alúmen e outros ingredientes utilizados alhures, além de significarem aumento de custo e trabalho, fornecem ainda borracha de menor valor e conservação.

Terminado o fabrico naquela zona, o grupo levanta acampamento transportando o gênero de sua colheita, quase sempre sob a forma de “miricicas[2]”, espécie de filas de pranchas colocadas umas em seguida das outras, atadas a uma comprida vara por fortes cipós. Um homem destro montado nessa embarcação de nova espécie comanda as manobras desviando das pedras, remansos e ilhotas com auxílio de uma forquilha que manobra o jeito, atirando-se n’água a aproximação de torvelinho das quedas bruscas, para ir alcançar o seu barco-carga no estirão seguinte com algumas braçadas.


BIBLIOGRAFIA UTILIZADA:
ATZINGEN, Noé C. B. von - Vocabulário Regional de Marabá. 2ª edição, revista, ampliada e ilustrada. Marabá: Fundação Casa da Cultura de Marabá, 2014.
BRANDÃO, José da Silva – As origens de Marabá de 1590 – 1913, volume I. Editora Chromoarte, 1998.
EMMI, Marília Ferreira – A oligarquia do Tocantins e o domínio dos castanhais. – Belém: Centro de Filosofia e Ciências Humanas/NAEA/UFPA, 1987.
JADÃO, Paulo Bosco Rodrigues-  Marabá. A História de uma parte da Amazônia, da gente que nela vivia e da gente que a desbravou e dominou, fazendo-a emergir para a civilização, de 1892 até nossos dias.  Editora Prefeitura Municipal de Marabá, 1ª edição, 1984.
LAGENEST, D. Barriel de – Marabá, cidade do diamante e da castanha, Editora Anhambi S.A. São Paulo, 1958.
MATTOS, Maria Virgínia Bastos de – História de Marabá. Revista e aumentada. Editora Fundação Casa da Cultura de Marabá, 2ª edição, 2013.
SAMPAIO, Paulo – Soldado da borracha, herói esquecido, 1ª edição, 2007
VIAGEM AO TOCANTINS – Livro apócrifo, Editora Grafisa, Belém, Pará, 2ª edição, 1983

NA INTERNET

www.youtube.com/buenasideias



[1][1] Bot.1. Pequeno gênero de árvores euforbiáceas, sul-americanas, dotadas de folhas trifolioladas, pequenas flores apétalas, em panículas, e fruto capsular; muitas espécies fornecem látex us. no fabrico da borracha.2. Qualquer espécie desse gênero, como, p. ex., a Hevea brasiliensis (v. seringueira).
[2] Miricica, substantivo feminino, amarradio de peças de caucho que muitas vezes eram levadas pelo rio até Marabá. O mesmo que imbiricica. (Atzingen)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.

Imprimir Artigos

Print Friendly and PDF